Logo no início da entrevista que concedeu ao Podcast Rio Bravo (episódio #651), Matthew Kramer, professor de filosofia política e jurídica da Universidade de Cambridge, respondeu a uma pergunta talvez fundamental para a compreensão de sua obra: por que debater a natureza do direito é importante hoje?
Para discutir esse assunto, Kramer retomou o argumento que desenvolveu no livro H.L.A Hart: The Nature of Law, que está para ser publicado no Brasil pela EdUniChristus (com tradução de Gilberto Morbach, editor do site Estado da Arte). “Neste livro, concentrei meus esforços naquela que é a sua mais importante contribuição para a filosofia do direito, que é a jurisprudência. Isso tem a ver com a natureza do direito em si mesmo”, argumenta Kramer.
Nesse sentido, continua o professor, é possível identificar o que os vários sistemas legais em diferentes países têm em comum. “Foi esse tema que Hart explorou, acima de tudo, em um livro publicado em 1961, The Concept of Law“, comenta.
Aprofundando esse debate, Matthew Kramer afirma que se alinha à proposta de Hart, ou seja, nosso entrevistado também se considera um defensor do positivismo jurídico. “Sim, decerto que existem posições de Hart com as quais eu discordo, mas quando se trata das questões envolvendo a teoria geral do direito eu estou de acordo com ele”. E o que isso significa? De acordo com Kramer, o defensor do positivismo jurídico acredita que o direito não é um fenômeno inerentemente moral. Dito de outro modo, ao contrário do direito natural, o positivismo não considera a moralidade como requisito para a validade da lei.
Em outro momento da entrevista, Kramer respondeu a respeito da sua preocupação com a defesa do liberalismo, uma causa que tem sido atacada tanto à esquerda quanto à direita. Ao Podcast Rio Bravo, o professor da Universidade de Cambridge criticou a Venezuela, sob o comando de Hugo Chávez e Nicolas Maduro, assim como os Estados Unidos, sob o comando de Donald Trump. “Ainda que eu esteja escrevendo em defesa dos ideais da democracia liberal, eu tenho prestado atenção aos desdobramentos contemporâneos”, comenta o professor.
Já quando foi perguntado acerca do discurso de ódio, um tema sensível aos defensores da liberdade de expressão, Kramer destacou o quanto esse tema merece atenção. Nas palavras do professor: “Sob o princípio moral da liberdade de expressão e sob princípio legal da Primeira Emenda nos Estados Unidos, muitas instâncias do discurso de ódio não seriam objeto de restrições legais.” Ao mesmo tempo, Kramer entende a legitimidade dessa proposição: “É óbvio que o discurso de ódio é repugnante, é isso que faz dele discurso de ódio, afinal”.
Na última intervenção, Kramer reagiu à questão da sobrevivência do liberalismo como ideia num mundo marcado por lideranças políticas estridentes, que muitas vezes se opõem aos valores da democracia liberal. Infelizmente, ele não vê um desfecho favorável para a Venezuela, ainda que o país possa renascer das cinzas. Já em relação aos Estados Unidos, o professor entende que se trata de uma nação resiliente o bastante para sobreviver à administração Donald Trump. “Biden não é uma alternativa perfeita, mas é consideravelmente superior ao presidente anterior”. Quanto ao Brasil, o diagnóstico não é tão favorável, “por conta da presidência Bolsonaro e da pandemia, e nesse caso um fator está ligado ao outro, haja vista que a administração do presidente tornou a pandemia ainda pior”. Seja como for, Matthew Kramer ainda guarda algum otimismo: “Os valores da democracia liberal podem ser confirmados no Brasil”.
A entrevista completa de Matthew Kramer, professor de filosofia política e jurídica da Universidade de Cambridge, pode ser acessada a partir do link acima.
Fabio Cardoso é jornalista e produtor do Podcast Rio Bravo.
