A declaração de Rossieli Soares, secretário de educação do Estado de São Paulo, não deixa dúvidas. “Aquilo que já era ruim ficou pior”. O comentário foi feito a partir dos resultados desastrosos do Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo, o Saresp. Para que se tenha uma ideia do estrago, em matemática, os alunos do quinto ano da rede estadual do ensino fundamental têm o mesmo nível de conhecimento de um estudante do segundo ano. Já em Língua Portuguesa, o aluno que está no quinto ano tem a mesma proficiência de um estudante de terceiro ano do ensino fundamental. É a maior queda na série histórica, iniciada em 2010. Será que essa performance tem a ver exclusivamente com a pandemia – e, por extensão, com as aulas remotas? Para responder a essa e a outras questões, nossa convidada na edição #687 do Podcast Rio Bravo é Claudia Costin, diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais da Fundação Getúlio Vargas.
Antes de responder se a pandemia é ou não responsável pelo atual estado de coisas na educação paulista, Costin traça um panorama bastante abrangente de como estava o processo de aprendizagem nos últimos anos. A situação estava longe de ser confortável, conforme a entrevistada explica no parágrafo a seguir.
“Evidentemente, a educação brasileira já tinha muitos desafios antes da pandemia. O resultado do Saeb, uma avaliação nacional, de 2019 mostrava que só 10% dos alunos sabiam o suficiente em matemática. Em 2017, nós estávamos piores do que isso, pois o índice era de 9,1%. Em português, em 2019, o índice era de 37%, também superior ao de 2017, mas claramente insuficiente. A rede estadual também vinha apresentando sinal de melhora, mas ainda não era o bastante. O Brasil melhorou nos dados do Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica), mas individualizando São Paulo é possível dizer que, em 2017, a média do Estado era de 3,7 (melhor que a do país, de 3,5), e agora passou em 2019 a ser 4,3 contra 3,9 da média brasileira. De fato, é um progresso, mas nós não podemos pensar pequeno. Quer dizer, numa escala de 0 a 10, considerar que 4,3 é algo adequado evidentemente não é.”
Costin destaca, ainda, que, mesmo antes da pandemia, o Brasil foi considerado o segundo país mais desigual do ponto de vista educacional entre as 79 economias que participaram do último PISA. “Não é que estávamos bem antes da pandemia. Tínhamos desafios. Estávamos muito lentamente avançando em relação a eles e veio a pandemia”.
Com a pandemia, houve queda acentuada nos resultados. Para a entrevistada, é uma mostra de que, embora tenha havido esforço muito grande do governo estadual de garantir algum aprendizado em casa, isso não é suficiente. “Foi muito mais uma estratégia de mitigação de danos do que uma forma de ensinar, dada a baixa conectividade, a baixa disciplina para o estudo autônomo por parte das crianças e dos jovens, especialmente os pais de muitos deles não estavam em casa em teletrabalho como a classe média; estavam na rua buscando alguma fonte de renda. Então, sim, em grande medida, isso é culpa da pandemia – e da maneira inadequada que a pandemia foi gerenciada do ponto de vista sanitário e da coordenação nacional do esforço educacional frente a pandemia”.
Tendo em vista os números do Saresp, e olhando para as perspectivas adiante, Claudia Costin destaca a complexidade para a retomada de um ciclo virtuoso, sobretudo porque parte significativa do problema da educação envolve o corpo docente. “Olha, não vai ser fácil. É extremamente desafiador. O Brasil tem baixa atratividade para a carreira de professor e a formação que o professor recebe no ensino superior é claramente inadequada para a mais complexa das profissões”. Costin observa que não há diálogo entre teoria e prática, de modo que o preparo dos futuros professores não atenta para as questões que precisam ser trabalhadas em sala de aula no sentido de desenvolver os estudantes.
A diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais da Fundação Getúlio Vargas, no entanto, entende que este momento é chave para mudar de patamar a educação brasileira. “Nós não queremos mais a educação de 2019; nós temos de nos preparar para combinar duas coisas que são elementares em tempos de quarta revolução industrial: excelência e equidade. É fácil ter uma educação excelente para poucos, mas o desafio que nós temos, olhando para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, é garantir excelência para todos”.
A entrevista completa de Claudia Costin, diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais da Fundação Getúlio Vargas, está disponível no link acima.
Fabio Cardoso é jornalista e produtor do Podcast Rio Bravo.