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Podcast 792 – Flávia Pini:  A história do primeiro Venture Capital brasileiro focado em Retail Techs

Formada em publicidade e propaganda, Flávia Pini, nossa convidada no Podcast desta semana, não imaginava trabalhar no mercado financeiro. Atualmente, ela é sócia da HiPartners, o primeiro Venture Capital brasileiro focado em Retail Techs, e este é o assunto de parte considerável deste episódio. Em outro momento da conversa, e por ocasião do Dia Internacional da Mulher, a executiva ressalta que, às vezes, o mercado financeiro pode, sim, ser difícil para uma liderança feminina. Mas Flavia Pini observa que não quer ser reconhecida pelo gênero; antes, pela competência.

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Lei nº 14.754/2023: A alavancagem dos Fundos Imobiliários e Fiagros

Lei nº 14.754 e suas implicações na alavancagem dos fundos imobiliários e fiagros

O final de 2023 foi marcado pela promulgação, em 13 de dezembro, da Lei nº 14.754, que introduziu alterações significativas na tributação dos fundos fechados e dos investimentos offshores e, ainda, a inclusão de novas regras a respeito do pagamento de rendimentos isentos de imposto de renda dos fundos imobiliários.

As dificuldades encontradas na Lei nº 14.754

Diante da complexidade da nova lei e dos impactos tributários nas atuais estruturas de investimentos, uma novidade, sem natureza tributária, não obteve o destaque merecido na mídia especializada e, aparentemente, passou desapercebida de boa parte do mercado. Tal novidade está prevista nas Disposições Finais da Lei, que, no seu artigo 42, alterou os artigos 7 e 12 da Lei nº 8.668/1993, que dispõe sobre a constituição e o regime tributário dos fundos de investimento imobiliário e dos Fundos de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais (Fiagro).

Com essa mudança, a Lei nº 8.668/1993 passou a prever expressamente a possibilidade dos fundos imobiliários e Fiagros, por meio de seus recursos e representados por suas instituições administradoras, (a) constituírem quaisquer ônus reais sobre os seus imóveis e (b) prestarem fiança, aval, aceite ou coobrigarem-se sob qualquer forma, desde que as referidas hipóteses sejam para garantir obrigações assumidas pelo próprio fundo ou por seus cotistas.

Vantagens da alteração legislativa

A alteração legislativa para autorizar a constituição e a prestação de garantias pelos fundos imobiliários e Fiagros é muito bem-vinda e aguardada pelo setor, pois vai possibilitar aos gestores maior acesso ao crédito para novos investimentos e até para reestruturações dos fundos e, consequentemente, maior liberdade para realizar operações estruturadas (CRI e CRA, por exemplo) com juros mais atrativos, buscando, assim, melhorar o retorno dos investimentos aos seus investidores.

Vale lembrar ainda que há interesse público na prestação de garantias no setor imobiliário, haja vista a própria Lei nº 9.514/1997, que dispõe sobre o Sistema Financeiro Imobiliário – SFI e instituiu a alienação fiduciária de coisa imóvel, além de outros inúmeros projetos imobiliários, dos mais tradicionais aos mais estruturados, em que a outorga de garantia é essencial para obter linhas de crédito mais vantajosas.

É claro, no entanto, que a novidade não deve ser vista como uma sinalização para qualquer tipo de operação de financiamento apenas para melhorar no curto ou médio prazo o retorno dos investidores, de modo que a análise técnica do cenário atual do fundo e dos potenciais investimentosdeve ser realizada com a maior diligência possível pelos gestores, observando sempre a política de investimento de cada fundo e os melhores interesses dos cotistas.

Marco Legal das Garantias

Outros fatores que contribuem para o momento propício da alteração trazida pela Lei nº 14.754/2023 são a sanção do Marco Legal das Garantias (Lei nº 14.711/2023) e a recente decisão do Supremo Tribunal Federal com relação à constitucionalidade do procedimento de execução extrajudicial da alienação fiduciária previsto na Lei nº 9.514/1997. Embora possam parecer atos isolados as recentes alterações legislativas e as decisões do Poder Judiciário, tais atos, em conjunto, contribuem para a segurança jurídica dos mercados de capitais e financeiro e do segmento imobiliário, corroborando para o contínuo desenvolvimento e crescimento econômico do mercado brasileiro.

A despeito da novidade da prestação de garantidas pelos fundos imobiliários e Fiagros estar prevista na Lei nº 8.668/1993, ainda será necessário aguardar uma outra etapa para os administradores e gestores dos fundos a colocarem em prática. Essa etapa é a manifestação da Comissão de Valores Mobiliários, que deve alterar a norma vigente de fundos imobiliários e adaptar o futuro anexo normativo do Fiagro à Resolução CVM nº 175/2022, objeto da Consulta Pública SDM nº 03/23, para refletir expressamente a alteração da Lei nº 8.668/1993, e, ainda, detalhar o procedimento ou requisito de especificidade a ser observado pelos prestadores de serviço essenciais, como por exemplo, a aprovação da prestação de qualquer garantia em assembleia geral de cotistas.

Apesar da necessária manifestação da CVM, a prestação de garantias pelos fundos não é nenhuma novidade para a autarquia e o mercado financeiro. A possiblidade do administrador, em nome do fundo, prestar fiança, aval, aceite ou coobrigar-se sob qualquer outra forma é assunto sedimentado nos Fundos de Investimentos em Participações, vez que tal possibilidade foi autorizada por meio da Instrução CVM nº 535/2013 (revogada), alterando a então vigente Instrução CVM nº 391/2003 (revogada), desde que o regulamento do fundo estabelecesse a possiblidade de prestação de garantia e aprovação mediante maioria qualificada dos cotistas (conforme definido em regulamento) reunidos assembleia geral.

Além disso, vale ressaltar que os recentes normativos da CVM permitem a outorga de garantias nas operações de fundos de investimento, a exemplo dos fundos financeiros previstos na Resolução CVM nº 175/2022, trazendo como requisito, para os fundos distribuídos ao público em geral (artigo 86, §2º da parte geral da Resolução CVM n° 175/2022), a aprovação em assembleia e ampla divulgação dos riscos de tais garantias aos investidores.

Por Thales Paiva

Thales Paiva é Gerente Jurídico e Sócio da Rio Bravo Investimentos.

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Artigos

Retrospectiva 2023

2023 não começou muito calmo. Costuma ser assim quando a passagem de ano traz uma mudança de governo. Dessa vez foi bem complexa.

Em janeiro, no restrito plano da economia 2023, a dificuldade começava pela longa e elaborada costura para definir o novo ministério, urdida simultaneamente à aprovação de uma Emenda Constitucional de índole orçamentária (conhecida como “a PEC de Transição”), passando pelas arruaças golpistas de 8 de janeiro, o anúncio das “inconsistências” nas Americanas no dia 11 e culminando com o primeiro “pacote econômico” do ministro Fernando Haddad no dia 12.

A importância da economia 2023 para o novo governo se revela prontamente no novo desenho para o ministério, em cujo centro está o desfazimento do antigo ministério da Economia. O ministério antes ocupado por Paulo Guedes seria decomposto em seis outros: Trabalho (Luiz Marinho, da CUT), Previdência (Carlos Lupi, do PDT), Indústria e Comércio (Geraldo Alckmin, vice-presidente), Gestão (Ester Dweck, professora da UFRJ), Planejamento e Orçamento (Simone Tebet, senadora do PMDB) e Fazenda (Fernando Haddad).

Em virtude desse desenho, que é parecido com o de 1994, teve que ser reconstruído (através da Medida Provisória de n. 1.158) o CMN (Conselho Monetário Nacional), bem como de sua Comissão Técnica da Moeda e do Crédito (COMOC). O perigo era alguma alteração no COPOM e sua disciplina, ou no equilíbrio de forças da governança da moeda estabelecida em 1994.

Felizmente, o redesenho não trouxe nenhuma inovação, inclusive e especialmente na delicada dinâmica do sistema de metas para a inflação. O novo CMN, reassumindo o desenho com três membros, aparece publicamente pela primeira vez no anúncio do pacote do dia 12 de janeiro, o primeiro do ministro Haddad, com jeito de governo de “coalizão”: o PT (Haddad), a 3ª via (Tebet) e o Banco Central do Brasil (Campos Neto).

O presidente da República demorou a sair do palanque, especialmente pela sua insistência em tratar do Banco Central e dos juros. Foi a primeira eleição em que o BCB estava no regime da Lei Complementar 179, de 2021, o primeiro e dificílimo teste do novo modelo institucional. Nesse sistema, os dirigentes do BCB, incluído o seu presidente, tinham mandatos a cumprir e não eram mais de livre nomeação do presidente eleito. No tocante a seus dirigentes, o BCB passava a ter regras semelhantes às de outras agências reguladoras, vale dizer, dirigentes com mandatos não coincidentes com os do presidente da República.

A influência do novo arranjo sobre as decisões de política monetária é um tópico em aberto. Teria o BCB reduzido demasiadamente a SELIC no terço final da pandemia? Teria elevado demais logo a seguir, durante o período eleitoral? Teria mantido a SELIC muito alta muito tempo?

Mesmo sem uma resposta muito clara para essas perguntas, a sensação é de que foi bem-sucedida a alteração institucional elevando a autonomia do BCB. O país não experimentou instabilidade macroeconômica ou financeira durante a mais contenciosa e polarizada de todas as eleições presidenciais desde 1989.

A dinâmica decisória na área econômica seria reveladora, sobretudo tendo em vista que a economia 2023 não foi um assunto muito debatido nessas eleições. Quais eram os reais planos econômicos do presidente eleito?

Em Brasília, o que se ouvia era que o presidente da República ia mandar na Economia 2023 porque dois ministros seus são suficientes para formar uma maioria no CMN. No entanto, esse colegiado sempre decide por consenso, de modo que não teve voto divergente, nem voto “ad referendum” desde a sua reforma em 1994.

Como iria funcionar esse novo CMN?

Tudo parecia muito novo e experimental na área econômica, uma vez que os dois ministros a ocupar as pastas “protagonistas”, Fazenda e Planejamento, não eram do ramo e sequer imaginavam que iam estar nessas posições 30 dias antes de suas nomeações.

Impossível afastar a sensação de improviso, um tanto dissimulada pela diligência de Haddad e sua vontade de acertar.

Essa discussão sobre influência política na moeda, ou sobre “bancadas” e votos divergentes, não prospera com respeito ao CMN, mas vai se transportar ao longo do ano para o COPOM, um colegiado de nove membros e que, ao final de 2023, já teria quatro novos integrantes escolhidos pela atual administração. Mas a liderança do BCB na condução da política monetária, vale dizer, a integridade do sistema de metas, não foi alterada, a despeito do mau humor presidencial quanto aos juros e quanto à governança da moeda.

O mérito pela preservação do sistema é parte conceitual, parte pessoal.

O sistema de metas já conta vários anos de bons serviços ao país. Seria uma tolice mudar. O conceito estava maduro, e assim permanece. Mas o mérito pessoal cabe ao presidente do BCB, Roberto Campos Neto, que teve muita paciência, atributo essencial para o primeiro presidente do BCB com mandato convivendo com um presidente da República ferozmente adversário daquele que o nomeou e com certa má vontade relativamente à delicada construção institucional que veio a herdar.

Desancar os juros altos é normal e aceitável, para qualquer político, desde que sem exageros. Todos os presidentes sempre reclamaram da taxa de juros. Como também os senadores, inclusive da situação. Mais ou menos como os exportadores reclamam da taxa de câmbio. Quando podia demitir o presidente do BCB “ad nutum” o presidente da República se queixava dos juros em “off”. Fazê-lo abertamente convidava a pergunta sobre por que não demitir. Quando perdeu esse poder, o presidente ganhou o privilégio de reclamar publicamente, ainda que sem consequência. Parece que Lula se sente melhor nessa nova situação.

Provocar o mercado financeiro

São comuns as diferenças de opinião sobre o nível adequado de juros diante de variações conjunturais na economia 2023. Entretanto, as falas do presidente sobre esse assunto, sobretudo no primeiro semestre do ano, deixaram atrás de si uma sensação ruim, mesmo sem ter nenhum efeito prático, senão o de provocar desnecessariamente o mercado financeiro, que parecia disposto a abraçar a nova administração desde o primeiro dia.

Essas tensões escalaram em março, quando Lula se referiu a Roberto Campos Neto como “aquele cidadão”. Era grotesco, ainda que não inconstitucional, o presidente da República ralhar em público com o presidente do BCB, com isso se equiparando ao presidente anterior em suas diatribes contra os conselheiros da ANVISA. Era uma repetição da implicância com o conhecimento especializado, agora em economia.

Se a ideia era “pazuelizar” o BCB, esta seria a missão dos primeiros dirigentes indicados por Lula para o BCB, sobretudo Gabriel Galípolo, que vinha ocupando a Secretaria Executiva do ministério da Fazenda, e foi o nome escolhido por Haddad (talvez para evitar um nome do PT). Mas não foi o que se observou. Na primeira reunião do COPOM de que participou, a 256ª, Galípolo votou com Roberto Campos Neto por uma redução da SELIC de meio ponto. O placar foi de 5×4 para a posição vencedora (queda de meio ponto) contra a queda de 0,25%. Foi o primeiro 5 a 4 da história do COPOM.

Nas reuniões posteriores do COPOM, as decisões foram de consenso na redução de 0,5% na SELIC, de modo a encerrar o ano em 11,75%. Galípolo não foi voto divergente em nenhuma dessas reuniões e nem foi mais uma presença na imprensa e nas redes sociais, tampouco o “contraponto” à política monetária. É discutível se devem existir “bancadas” no COPOM, inclusive de natureza partidária, uma “vermelha” (lulista, petista ou abertamente heterodoxa) e outra “muito durona”, como definiria o ministro Haddad em dezembro.

Seriam as indicações para o BC como as que o presidente faz para o STF, pessoas com o “notório saber”, mas “de confiança”, como Cristiano Zanin e Flavio Dino?

Lula já indicou quatro novos dirigentes do BCB, dois servidores da casa, para diretorias com esse perfil, Ailton Aquino e Rodrigo Teixeira, e dois economistas “de fora”, Galípolo e Paulo Picchetti, professor da FGV-SP. No final de 2024, terminam os mandatos de Roberto Campos Neto e de dois outros diretores. Lula terá o “controle” da instituição ao escolher os substitutos, sobretudo o presidente, somando sete nomeados seus de um colegiado de nove.

Como isso vai alterar a política monetária?

Espera-se que não haja alteração em 2024 e adiante. Tal como se passou em 2023.

Resta ver como o presidente fará isso através de suas escolhas, inclusive e principalmente para o lugar de Campos Neto, que terminou o ano de 2023 participando alegremente de churrasco na Granja do Torto em harmonia com o presidente e seu entorno.

A meta de inflação para 2023 era de 3,25% com 1,5% de margem de tolerância, portanto com um “teto” de 4,75% e as expectativas para o IPCA para 2023 aferidas pelo Focus (em 22/12, último do ano) estavam em 4,46%. Ou seja, tudo indica que o BCB cumprirá a meta, embora dentro do intervalo de tolerância. Não haverá “carta aberta” desta vez, e o primeiro presidente do BCB com mandato deixará o seu posto com sua missão cumprida. Talvez tão difícil quanto reduzir o IPCA tenha sido engolir em seco diante de provocações públicas a que esteve sujeito. O “ganho institucional” foi gigantesco.

Foi um ano complexo do ponto de vista fiscal, e os temas principais foram de natureza orçamentária. O enredo começa antes da posse, com a já citada PEC da Transição, um pequeno milagre de governabilidade, pelo qual a legislatura anterior passou uma emenda constitucional em um mês, criando condições para que o Bolsa Família ampliado continuasse a ser pago sem interrupções.

Recriar certa normalidade orçamentária e fiscal era um desafio claro, em vista da singularidade das soluções encontradas para lidar com a pandemia no governo anterior. Não faz sentido fazer política fiscal através de emendas constitucionais. Ou seja, a de transição devia ser a última, ao menos tratando de orçamento.

No corpo dessa PEC, que se tornou a EC126, de 21/12/2022, havia um comando importante, que veio a se tornar o “arcabouço fiscal”. Conforme estabelecido no seu artigo 6, o presidente da República deveria “encaminhar ao Congresso Nacional, até 31 de agosto de 2023, projeto de lei complementar com o objetivo de instituir regime fiscal sustentável e que [apenas] depois da sanção desse projeto diversos artigos do ADCT estarão revocados, especificamente os que definem a mecânica do “teto de gastos”[1].

O governo encaminhou esse projeto no dia 30 de março, última quinta-feira do mês, no final do expediente. Não foi, como alguns esperavam, uma nova lei para regular o orçamento, a fim de substituir a lei 4.320/1964 e prestigiar o voto da ministra Carmen Lúcia no assunto das emendas ao orçamento secreto. Para a substituição do “teto”, o governo trouxe regras fiscais de natureza macro, que passaram a dominar os debates sobre política fiscal no restante do ano. As declarações e as intenções pareciam boas, sobretudo tendo em vista que o “novo teto”, ou o novo arcabouço, estava sendo proposto por opositores ferrenhos da ideia de “teto” ou mesmo de responsabilidade fiscal e sustentabilidade da dívida.

O “arcabouço” provocou duas famílias de juízos. De um lado, emergiram dúvidas sobre o real compromisso com suas metas, eis que a nova fórmula parecia, em seus aspectos formais, a famosa banda diagonal endógena, de triste memória. Ou seja, parecia uma fórmula de impossível execução, cujo anúncio se esgotava em si mesmo. Seria mesmo para valer? Ou o arcabouço estaria destinado a servir como um “protocolo do gasto”, conforme a definição do professor Rogério Werneck?

De outro lado, as diversas análises de especialistas convergiam em que as metas anunciadas para o resultado primário somente seriam viáveis na presença de ganhos de arrecadação superiores a 150 bilhões. Não parecia um número tão difícil num orçamento de 2 trilhões, mas o silêncio governamental sobre o assunto mostrava que não havia nenhuma ideia sobre como consegui-lo. Eram números à procura de um plano, e não a expressão numérica de um plano de governo.

Seria o prenúncio de uma elevação relevante da carga tributária? Pacotes tributários estariam a caminho? Ou seria simples voluntarismo?

A conta precisa fechar

Inicialmente, o ministro negou a intenção de aumentar a carga tributária: “se por isso se entende a criação de novos tributos ou aumento de alíquota dos tributos existentes, não é a ideia, não é disso que se trata”. Mas passou o restante do ano correndo atrás de receitas, meio capturado pela Receita Federal, trabalhando “no subsolo” das renúncias, bases de cálculo e decisões judiciais (e administrativas), e muito empenhado em evitar algum a contenção de despesas.

Simultaneamente, o ministro precisava afastar a urgência de aumentar a receita do debate sobre a reforma tributária, inclusive para não a comprometer.

O fato incontornável é que se o inflacionismo está afastado, bem como o aumento do endividamento, a manutenção e especialmente a elevação do gasto (investimento) público, que é típica e própria dos governos petistas, dependerão do aumento dos impostos. A conta precisa fechar. Tipicamente, o “fechamento” pela direita se dá através da redução do gasto (do tamanho do Estado). Pela esquerda, o que se apresenta é o aumento nos impostos e de sua progressividade.

O esforço de preservar a integridade dessas metas do arcabouço diante do “fogo amigo” vindo das esferas políticas foi uma das grandes conquistas do ministro Haddad nesse primeiro ano de governo. Não obstante, a novidade representada pelo novo arcabouço fiscal não gerou as expectativas favoráveis que se esperava quanto ao regime fiscal. Tudo dependeria de um equilíbrio político meio frágil, dentro do governo, uma vez que ficava sujeito às vontades cambiantes do presidente da República e de outras lideranças políticas. Portanto, o arcabouço não alterou de forma material o balanço de forças no assunto da política monetária.

A apresentação do arcabouço fiscal parecia destinada a confrontar o BCB com a obrigação de apressar a redução nos juros, uma vez que resolvesse a evidente inconsistência entre a meta da inflação e a política fiscal. Não era uma má teoria, se, de fato, o arcabouço fornecesse a solução para o problema fiscal brasileiro. Só que não era isso.

Pior, até: com o problema fiscal sem solução, muitas perguntas difíceis se apresentavam. Será mesmo possível que o presidente Lula, em seu terceiro mandato, fora de circunstâncias excepcionais no campo das commodities e de heranças magníficas, conseguirá governar com responsabilidade fiscal? A Nova Matriz macroeconômica poderia ressurgir?

A desproporção entre desejos e possibilidades é um problema crônico da política fiscal. A União esgotou sua capacidade de se endividar e não pode pagar suas contas fabricando papel pintado. Exatamente como os entes federativos diante das restrições da LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal). O ministro Haddad talvez reconheça o que tem diante de si: Brasília se parece com uma grande prefeitura com problemas de caixa.

Talvez o ministro tenha se iludido em pensar que a União é diferente, pois, em tese, pode emitir moeda e se endividar em variados formatos. Entretanto, dificilmente terá prefigurado que esses truques já estão esgotados há anos.

As primeiras votações importantes, a partir de propostas do novo ministro, ocorreram apenas em maio, com resultados mistos. As vitórias parecem de Lira, as derrotas do Executivo. O governo quase perde a MP 1.154/23 que redefinia a Esplanada (a nova arquitetura dos ministérios). Seria uma crise. A relação com o Legislativo parecia tão frágil em meados de 2023 que era melhor não declarar as prioridades. Com isso, o governo evitava falar de seus planos econômicos, mas conversava e negociava concessões, emendas e mesmo cadeiras em ministérios para o chamado Centrão.

Foi então que veio a notícia do crescimento do PIB no primeiro trimestre: 1,9% de crescimento no trimestre sobre o trimestre anterior, um número muito forte, e bem maior que a mediana das expectativas. Em condições normais uma notícia boa; no entanto, a explicação para a surpresa residiu integralmente no comportamento do PIB agropecuário, 21,6% de crescimento no trimestre sobre o trimestre anterior. Era um “Pibão desconfortável”, conforme definiu um observador arguto (Carlos Alberto Sardenberg, em coluna para o jornal O Globo, de 03/06), uma vez que o governo parece associar o agro ao governo anterior.

Com ventos melhores na economia 2023, ainda que acidentais, tudo se encaixou.

Em junho, começa uma acomodação do rating do país, quando a S&P anunciou que o colocou o risco soberano do país em perspectiva positiva. O upgrade viria em dezembro, depois de votada a reforma tributária no Senado. Em julho, a Fitch faria o seu upgrade, mas todas as agências se alinharam em colocar o Brasil dois níveis abaixo do grau de investimento, e sem perspectiva de ir além disso. É o que temos por ora, e vai ser difícil sair desse nível sem um “fato novo” de certo impacto.

“Carta aos brasileiros” em outro formato

A meta de buscar o investment grade, uma vez adotada, ofereceria uma excelente fórmula para domar os instintos keynesianos do governo, e avançar pautas reformistas. Mas o assunto é tratado com muita cautela. As “reformas” que tanto agradam as agências não fazem parte das aspirações dos governos de esquerda. Talvez por isso mesmo seja considerada “histórica” a reforma tributária. “Histórica” porque improvável, e por isso mesmo um tanto distante do formato ideal.

Com efeito, a aprovação da reforma tributária, o evento que precipitou o upgrade da S&P não era uma pauta da esquerda. Na verdade, a reforma tributária era uma das reformas do Consenso de Washington, e sua justificativa em geral tinha que ver com a melhoria no ambiente de negócios, um assunto bem distante dos ideais históricos do petismo e de Lula.

Ao longo de sua intricada tramitação, ficou claro que o aumento da receita para sustentar um Estado maior não se confunde com a racionalização e simplificação dos impostos sobre o consumo. São temas diferentes. E não deu para misturar.

O fato é que os festejos na aprovação da reforma acabaram sendo reveladores. A pauta era mais transcendente do que parecia, mais do que simplesmente um assunto tributário.

A aposta na reforma tributária talvez melhor se explique pelo cálculo político. Era uma forma de escrever uma “carta aos brasileiros” em outro formato, com o intuito de agradar e assegurar apoios no mundo empresarial.

A energia política a ser empregada no projeto seria muito grande, pois sua tramitação seria, como efetivamente tem sido, longa e tormentosa. O assunto se estendeu pelo segundo semestre, e não terminou em dezembro com a promulgação da emenda. As leis complementares ainda vão consumir muita energia do governo ao longo deste ano e mesmo depois. O prazo total para a computação dos efeitos da reforma pode ser maior que uma década.

Como lição, resta observar que nada parece consumir mais energia política do que encrencas federativas, de modo que tudo o que se pode prognosticar sobre o andamento desse assunto, mesmo na restrita esfera da regulamentação, é que vai se prolongar além do esperado e com desgastes maiores do que pensa.

Nenhum governo foi tão longe quanto este nesse assunto, só resta saber se isto será bom ou ruim, no mérito ou como fato político. É cedo para aferir, mas certamente funcionou para ajudar a aterrissar o novo governo no terreno empresarial.

É compreensível e justa, portanto, a comemoração da sanção da emenda, ocorrida com muita festa em dezembro. É um segundo pequeno milagre de governabilidade que permite certo otimismo acerca das possibilidades de superação dos impasses decorrentes da polarização política. Mas não é o fim desse jogo.

Choques de oferta positivos, como os que operaram em 2023 para explicar o bom resultado das exportações e da balança comercial, às vezes caem dos céus, como no caso do super ciclo das commodities de uns anos passados. Mais seguro, entretanto, é fazer reformas mirando no aumento de produtividade e no ambiente de negócios.

Entretanto, a ênfase nas medidas e pautas reformistas modernizadoras, repita-se, não faz parte das prioridades declaradas do governo e do presidente Lula. Até pelo contrário, para melhor apaziguar aliados “radicais porém sinceros”, ou por afinidade ideológica mesmo, o governo fez gestões, felizmente sem sucesso, para interromper medidas como a privatização da Eletrobras e o marco do Saneamento, por exemplo.

Isso para não falar das ambiguidades do governo na governança da Petrobras.

Pode ser apenas “jogar para a torcida”, manobrar as aparências ou administrar uma coalisão política muito heterogênea. Ou não. Pode ser mesmo falta de liderança e de projeto. Impossível saber. A indefinição do governo na economia 2023, e em especial a sua hesitação do governo no assunto do equilíbrio fiscal, é uma de suas marcas mais visíveis.

Em outubro, refletindo essas dúvidas, o presidente da República deu uma longa e impactante entrevista parecendo querer desqualificar as metas fiscais do governo.

Nada pode ser pior para o ministro Haddad que o “fogo amigo” vindo do Palácio. O grande “plano de governo” na economia 2023 foi o arcabouço e seus números: se isso não é importante, o que sobra?

Haddad sentiu o golpe, e se possui 7 vidas, ou umas 3 ou 4, como se diz da média dos ministros da Fazenda, uma já se foi.

A manifestação de Lula sobre as metas fiscais de Haddad foi comparada ao famoso desabafo de Dilma Rousseff, pelo qual “gasto é vida”, a fala que serviu como marco definidor da Nova Matriz, de triste memória.

Como ilustração para as contradições em que se vê enredado o Ministro, note-se que o arcabouço “determina” uma expansão do gasto primário e, ao mesmo tempo, uma redução do déficit. É claro que essas duas coisas somente podem ocorrer simultaneamente se a receita crescer. Se isso não acontecer, o que vai se passar? Qual a determinação que vai prevalecer? A do gasto ou a do equilíbrio fiscal (na forma da lei de reponsabilidade Fiscal, que também é lei complementar)? São ponderáveis os riscos de desobediência aos ritos da política fiscal?[2]

O próprio presidente da República perguntou, em sua entrevista: “se for necessário esse país fazer endividamento para crescer, qual o problema?”

Pois é. Se o presidente não vê problema, nós temos, então, dois problemas.

Tudo considerado, entretanto, o país está bem mais maduro do que se supõe nos assuntos fiscais. O keynesianismo inflacionista não se confunde com a voracidade microeconômica do Legislativo para avançar no terreno das emendas orçamentárias. Não há nada ideológico na fisiologia, que vive de trocados. Caro mesmo é o desenvolvimentismo inflacionista.

O grande desafio do governo em seu primeiro ano foi o de aprender a viver sob limites, fiscais e monetários. O Legislativo e o BCB cumpriram seus respectivos papeis, a vida seguiu.

Não foi um ano especialmente bom na economia, nem ruim. Houve ganhos conceituais, especialmente relacionados ao desarme de várias bombas, tanto na oposição como na situação, e há muitos desafios pela frente.

Mas a sensação é positiva ao final. O país parece mais preparado para o futuro. Talvez prontidão não seja tudo, como supõe o célebre Príncipe da Dinamarca (‘Readiness is all’, Ato 5, cena 2). É muito, mas certamente não é garantia de sucesso.


[1] ADCT = Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, e os artigos relevantes são os seguintes: 106, 107, 109, 110, 111, 111-A, 112 e 114.

[2] A pergunta é feita exatamente nesses termos por Marcos Mendes e Marcos Lisboa em “Sobre o limite de despesas no Arcabouço Fiscal” em Brazil Journal 22/1//2023.

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“Outubro Vermelho” por Gustavo Franco

A entrevista concedida pelo presidente da República – amplamente publicada e repercutida nos últimos dias, apelidado de outubro vermelho, se tratando de assuntos fiscais – foi um pequeno desastre para o ministro da Fazenda.

Nada é pior que o “fogo amigo” vindo do Palácio, em “on”: o presidente questionando a política econômica publicamente. O grande “plano de governo” na economia foi o arcabouço e seus números: se isso não é importante, o que sobra?

Outubro vermelho e suas crises

No passado, nas incontáveis ocasiões nas quais esse enredo se repetiu, o rito foi o mesmo: o ministro vai ao presidente da República, diz que seu cargo está à disposição, pois pertence ao mandatário, e eles combinam alguma encenação de apoio e confiança, a fim de evitar um pedido de demissão.

O registro é que Haddad sentiu o golpe – e se possui sete vidas, ou umas três ou quatro, como se diz da média dos ministros da Fazenda, uma já se foi. Resta ver como vai resistir e seguir adiante. Será preciso acompanhar.

Não é incomum que o chefe do governo se entregue a exageros verbais com vistas a acalmar setores mais radicais do partido, ou de sua coalizão. Sobretudo esse chefe de governo.

Entretanto, Brasília aprendeu a discernir excessos brancos, de pura retórica, daqueles que são declarações sinceras, fora da caixa e da rotina, e que revelam nuances de divergências materiais que a comunicação oficial se empenha em ocultar.

A manifestação de Lula sobre as metas fiscais de Haddad foi comparada ao famoso desabafo de Dilma Rousseff, “gasto é vida”, a fala que serviu como marco definidor da Nova Matriz, de triste memória.

A ex-presidente está convenientemente bem longe, em Shanghai, alojada e exilada na presidência do NDB (New Development Bank), o banco dos BRICS. Mas suas ideias parecem mais vivas do que se poderia imaginar.

Com isso, Fernando Haddad termina o mês menor do que começou, o que se da o nome de outubro vermelho para o ministro.

O terceiro mandato e suas dificuldades

Somada às declarações sobre o Oriente Médio, as falas do presidente parecem destinadas a solapar a reputação de encantador de serpentes que Lula cultivou ao longo de sua carreira.

Tudo é mais difícil nessa sua terceira presidência, na economia como em Brasília, e a reedição de velhos programas, bem como de velhas receitas para o entrosamento com o Legislativo, e mesmo das falas intuitivas e improvisos do mandatário, não têm produzido bons resultados.

O outubro vermelho trouxe mais que uma fala inadequada do presidente. O encontro anual do FMI e Banco Mundial no Marrocos, um bom termômetro para as aflições econômicas globais, teria sido monótono, não fosse uma grande sombra pairando sobre todos: o conflito no Oriente Médio.

Mesmo que as consequências do conflito no terreno financeiro, ou sobre o preço do petróleo, ainda sejam indefinidas, como o próprio desenrolar e o alcance do conflito, o assunto possui gigantesco potencial desestabilizador.

Brasil: o país das reformas

No terreno legislativo, o outubro vermelho teve ao menos dois destaques, ambos tributários: a reforma (constitucional) nos impostos sobre o consumo (a dita “reforma tributária”) tramitando no Senado, e os avanços na Câmara do PL sobre impostos sobre fundos fechados e recursos offshore.

Os andamentos da reforma tributária no Senado não surpreenderam. O relatório do senador Eduardo Braga (de 25/10, apresentado na Comissão de Constituição e Justiça) chamou a atenção pela ampliação supostamente irrazoável de exceções e do período de transição.

O relatório produziu críticas contundentes, como a de Felipe Salto, ex-secretário da Fazenda de São Paulo e ex-diretor executivo do IFI (Instituição Fiscal Independente). Para Salto, o texto ficou tão complexo que talvez não valha mais a pena fazer (“Melhor não parir o mostrengo tributário”, O Estado de S. Paulo, 26/10/2023).

A reforma dos impostos de consumo já tinha fracassado várias vezes no passado, desde quando foi primeiro aventada nos anos 1990. A arquitetura melhorou, mas as dificuldades continuam grandes.

O ministro e o governo talvez tenham se iludido que o assunto estava maduro, e assim subestimado os recursos políticos necessários para uma tramitação tranquila.

A pauta do ambiente de negócios, que sempre foi a razão de ser dessa e de outras reformas, não é bem a cara desse governo. O problema será o de evitar o desgaste, afastando-se do tema, o que parece impensável na presença do ministro Haddad.

Xadrez econômico: área tributária

Também no terreno tributário, e mais diretamente na direção de se obter mais recursos para fechar as contas no contexto do arcabouço, veio a aprovação, na Câmara, do Projeto de Lei (PL 4.173), que trata da tributação de offshores, de investimentos no exterior e de fundos de investimentos fechados.

Não há tanto dinheiro em jogo, mas o ministro transformou o assunto numa campanha contra os ditos “super ricos”, e com isso o assunto ganhou importância como um tema de marketing político em desproporção com as receitas que de fato produziria.

O projeto provocou, portanto, sobressalto e desconfiança, sem falar em que pode “sair pela culatra”, por exemplo, se motivar a judicialização da temas aparentemente pacificados, como o “come-cotas”. Conforme lembrado por Marcos Lisboa e Vanessa Canado, o expediente serve para tributar ganhos que ainda não aconteceram, e podem não acontecer.

A Receita se ressente do uso que os contribuintes fazem das regras de “diferimento”, mas o fato é que o fato gerador (a renda) precisa ocorrer, tanto em fundos fechados quanto em offshores. Sem fato gerador não há imposto. Na verdade, sem ganhos já realizados, o que se tem é uma tributação sobre o patrimônio, não exatamente a prevista. E se alguém suscitar a constitucionalidade do “come-cotas”, que parece pacificado na sua incidência sobre fundos de investimento já durante alguns anos?

O uso da ideologia para definir um assunto

O fato é que o governo, e mais especificamente o ministro Haddad, politizou o assunto ao definir o PL como a “taxação dos super ricos”, assunto do qual ninguém de bom senso ousaria se opor. Mais ou menos como se fala sobre o imposto sobre grandes fortunas, que nenhum governo teve a coragem ou enxergou méritos objetivos para implementar. Tampouco este.

Por que o ministro não propõe taxar as grandes fortunas – que é, na prática, o que diz estar fazendo – em vez de mexer nas regras de investimento no mercado financeiro que geram muita espuma e pouca receita? Se é para tributar os super ricos pelo que de fato são, segundo algum critério objetivo que seria preciso definir, por que não o fazer de forma direta?

E a inflação como está?

A inflação está bem-comportada, ao menos por ora, com as expectativas sugerindo que o governo vai mirar (ou deixar-se limitar a) o teto do intervalo de tolerância, tal como se observou na época de Alexandre Tombini.

Para 2023, que já está em grande medida “resolvido”, a meta é 3,25%, e o teto de tolerância é 4,75% (3,25% + 1,50%) e mediana das expectativas (FOCUS de 30/10) para o IPCA está em 4,63% com leve oscilação para baixo. Para 2024, todavia, meta e teto são de 3,0% e 4,5%, mas a mediana das expectativas está em 3,90% com tendência de alta.

Não se espera que o COPOM altere a trajetória de queda de juros já sobre a mesa – com queda de 0,5% – nem o problema que vai haver em meados de 2024 quando começar o debate sobre a “taxa neutra” e também sobre o substituto para Roberto Campos Neto.

Dois nomes foram anunciados para substituir os dirigentes do Banco Central cujo mandato se encerra no final do ano: Paulo Picchetti, para substituir Fernanda Guardado, nos Assuntos Internacionais; e Rodrigo Teixeira, para substituir Marcelo Moura na Diretoria de Cidadania. Picchetti é professor da FGV-SP e Teixeira é funcionário de carreira.  

É um enorme progresso que o inflacionismo esteja mitigado e que se limite a usar “todo o espaço” que lhe permite o sistema de metas sem subvertê-lo. Não é o ideal, mas é a zaga aguentando a pressão do adversário, sem ceder espaço.

As instituições funcionam, ao menos na defesa da moeda

Um outro bom exemplo vindo de Brasília, e especificamente do STF, é a decisão que reafirmou a constitucionalidade da (retomada de imóvel no regime de) alienação fiduciária. A Lei 9.547, de 1997, criou o SFI (Sistema Financeiro Imobiliário) e assim deu efetividade a conceitos, entre outros, como o patrimônio de afetação, a segregação fiduciária de um empreendimento, bases para os CRIs (Certificados de Recebíveis Imobiliários).

Essa é uma lei que demorou a “pegar”, pois era preciso que os tribunais “reconhecessem” seus dispositivos, o que levou muitos anos. Ainda não temos um mercado de “mortgages” como nos EUA, mas o crédito imobiliário livre vai crescendo, bem como as securitizações e estruturas financeiras que apoiam o desenvolvimento imobiliário.

Foram duas décadas até o assunto chegar ao STF, já muito pacificado, mas nem por isso deixou de haver votos contrários, ou seja, pela inconstitucionalidade de retomada de imóvel dado em alienação fiduciária (ministros Edson Fachin e Carmen Lúcia). Surpreende, também, é que o noticiário sobre a decisão tenha sido tão “torto”, enfatizando o poder dos bancos para retirar a moradia das pessoas.  


[1] “O erro do ‘come cotas’” Brazil Journal de 25/10/2023.

Gustavo Franco – Senior Advisor da Rio Bravo

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Novo Arcabouço Fiscal, Regras e Discricionariedade

Entenda tudo sobre o Novo Arcabouço Fiscal

                                                                                                         

No campo fiscal, uma das reformas econômicas mais esperadas desde o começo do Governo Lula foi a definição do novo arcabouço fiscal, ou Regime Fiscal Sustentável, lei que substitui a regra do “teto de gastos”, e que foi sancionada pelo Presidente da República.

Assim como o “teto dos gastos”, o objetivo da nova lei seria estabilizar o grau de endividamento do governo brasileiro, auferido pela razão entre a dívida pública bruta e o produto interno bruto (PIB), que alcança a 84,1%, segundo o critério adotado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), colocando as contas públicas nacionais numa rota de insolvência no longo prazo.

Porém, a nova “âncora fiscal” adotada não trata de realizar um ajuste fiscal, que geralmente implica em redução das despesas públicas e aumento de impostos, para equilibrar o orçamento público.

Pelo contrário, o novo arcabouço fiscal permite que o gasto público cresça, desde que menos do que arrecadação tributária: 70% no caso do cumprimento da meta de resultado primário (receitas menos despesas públicas não financeiras) e 50%, em caso de descumprimento da referida meta.

Nesse sentido, um ponto muito preocupante é que as próprias metas de resultado fiscal primário em que a regra se pauta também podem passar a ser alvo de mudanças extemporâneas, como provavelmente acontecerá com a meta de 2024.

Política econômica deve ser flexível?

Há muito tempo se tem debatido se a política econômica deve ser uma regra, mantida “doa a quem doer”, ou se deve ser discricionária, adaptando-se às condições de curto prazo da economia.

A profissão da economia não se caracteriza por produzir muitos consensos. O grande economista John Maynard Keynes certa vez disse que se perguntassem uma opinião a doze economistas teríamos doze opiniões diferentes.

Contudo, um dos poucos consensos da profissão é privilegiar o estabelecimento de regras na condução da política econômica, pois a discricionariedade leva ao aumento da incerteza na economia, o que, pela dificuldade de projetar cenários futuros, termina por reduzir os investimentos produtivos, e, portanto, o crescimento econômico.

Uma meta fiscal que muda “ao sabor das circunstâncias” deixa de ser uma regra, e no caso brasileiro, além dos efeitos deletérios sobre os investimentos, significaria elevar o risco fiscal e o risco país, gerando maiores cotações do dólar, o que, por sua vez, pode dificultar a redução da inflação, impedindo maior redução dos juros, e assim também prejudicando a capacidade de expansão da atividade econômica.

Assim, ao mudar a meta de resultado primário 2024, e quem sabe as metas estabelecidas para os próximos anos, permitindo expansões adicionais do gasto, pode-se estar gerando maior bem-estar social no curto prazo, porém às custas de hipotecar esse próprio bem-estar a médio e longo prazo, o que em economia se chama de “inconsistência temporal”.

O impacto do novo novo arcabouço fiscal

O mercado, tanto a nível interno como externo, inicialmente recebeu bem o anúncio e a aprovação do novo arcabouço fiscal, porém, se este se mostrar insuficiente para controlar o crescimento do endividamento público e contribuir para elevar o nível de discricionariedade da política fiscal, não somente estará impedindo a recuperação da solvência fiscal do Governo brasileiro, como também limitando as possibilidades de desenvolvimento do País.

Ulisses Ruiz de Gamboa.

ULISSES RUIZ DE GAMBOA é economista do Instituto de Economia Gastão Vidigal da Associação Comercial de São Paulo (IEGV/ACSP)

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“Meia estação” por Gustavo Franco

Brasília se acalma quando o presidente viaja, pois boa parte da capital, juntamente com o noticiário, viaja com ele. O tema de mais essa etapa da diplomacia presidencial é a expansão do grupo BRICS, assunto de grande visibilidade, mas de efeitos econômicos “de longo prazo”, difíceis de se vislumbrar no primeiro momento.

Grandes debates podem ser entabulados sobre se os BRICS, ou se alguma expansão desse grupo, alcançarem a expressão e o significado do finado grupo dos 77 (G-77), os países ditos “não-alinhados”, de certo peso nos tempos da “guerra fria”.

O contexto é outro, mas há pouca dúvida de que o grupo se tornou algo bem maior que o prefigurado pelo criador do acrônimo, Jim O’Neill, em um já célebre relatório de pesquisa da Goldman Sachs.

Mas certamente parece exagerado pensar que o grupo possa entreter ideias ambiciosas, por exemplo, sobre a desdolarização do comércio internacional.

A construção e expansão do grupo está em andamento e não se sabe bem até onde poderá ir.

No Summit de Johanesburgo, agora no mês de agosto, o grupo Brics ajustou a inclusão de seis novos membros: Argentina, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Etiópia, Egito e Irã.

Não há mais um acrônimo que possa encapsular as iniciais desse novo G-11, e está aberta a temporada para as interpretações econômicas e geopolíticas sobre os termos de referência desse novo Brics.

O fato é que, sem a expansão de agora, os cinco membros originais respondiam por cerca de 15% do PIB mundial em 1992 e hoje sua contribuição ultrapassa 1/3, com 3,4 bilhões de pessoas, ou seja, mais de 40%da população do planeta.

A contribuição do G7 para o PIB global era de 45% em 1992 e passou a 28% em 2023.

É claro que esse G-11, ou o grupo BRICS depois de uma expansão (BRICS+), ainda pode crescer muito mais, porém, necessariamente, sua personalidade vai mudar.

Sua próxima expansão possivelmente confrontará não mais o G-7, mas o G-20, cuja presidência será do Brasil entre dezembro de 2023 e novembro de 2024. E o grande desafio do próximo ano, resumido em uma única palavra, será: Argentina.

Os novos membros do BRICS+ não necessariamente contribuirão capital para o banco, o NDB (New Development Bank, conhecido como o “banco dos Brics”). Embora isso possa ocorrer em se tratando dos novos sócios que vêm do Golfo Pérsico, os outros, como a Argentina, deverão permanecer na ponta tomadora, do outro lado do balcão, como clientes. Crescendo em direção a seus clientes, o BRICS+ tende a ser uma emanação da China, um desafio para os outros países fundadores do grupo Brics.

Cada um dos sócios originais do grupo possui sua agenda e seus interesses específicos e circunstanciais no desenvolvimento do bloco, que terá de se equilibrar numa linguagem sempre muito neutra para definir sua razão de ser e para acomodar as suscetibilidades de cada sócio.

Para o Brasil, resta evidente que o grupo e o conceito do BRICS+ permitem uma fusão entre a diplomacia pessoal do presidente da República e as agendas da esquerda do Itamaraty, bem representadas e assentadas no novo governo através da presença do embaixador e ex-ministro Celso Amorim, como um ministro sem pasta, ou chanceler “sombra”.

A inclusão da Argentina nessa primeira expansão do grupo BRICS pode ser vista como uma vitória brasileira, restando cogitar sobre o quanto deverá custar. Pode ser um favor para os Hermanos que, inclusive, afaste o Brasil de obrigações financeiras com o vizinho. Seria como fazer uma introdução, e deixar a dura conversa sobre funding com os sócios chineses. Mas talvez seja o contrário: o Brasil pode não conseguir se desvencilhar de contribuir para um pacote argentino, que parece provável em sequência às eleições de outubro, e que pode ser gigante e arriscado, e cuja construção provavelmente passará pelo G-20.

Um candidato que desafia descrições

A Argentina realizou em 14 de agosto as suas primárias presidenciais (PASO – Primarias Abertas Simultâneas Obrigatórias) e o grande vencedor foi Javier Milei, um candidato que desafia descrições: como definir o populismo pela direita, com fortes tonalidades de liberalismo de modalidade libertária, na pátria do peronismo?

A analogia com Bolsonaro é automática e um tanto perturbadora, mas não passa de uma aproximação: os outsiders políticos, como as famílias infelizes de Tolstói, o são cada um de um jeito.

A aceleração da inflação tem sido alarmante, bem como o estado das finanças públicas. Conservadoramente, o FMI estima que a inflação termine o ano em 120%, com queda de 2,5% no PIB, mas a situação fiscal se encontra em franca deterioração, sendo que o próprio FMI não acredita que o governo cumpra sua meta fiscal para o ano, um déficit primário de 1,9% do PIB. Há um acordo com o FMI em andamento, cuja sexta revisão revelou uma impressionante taxa de descumprimento.

As eleições presidenciais terão lugar em outubro, e vai se firmando a expectativa de um pacote anti-inflacionário radical.

A inflação é o grande assunto da eleição, e a atmosfera lembra a disputa brasileira de 1989, época em que o presidente era eleito em outubro e a posse ocorria em março do ano seguinte. A tensão vai crescendo de tal sorte que um pacote se torna inevitável para quem quer que vença.

Miliei tem como principal assessor econômico o economista Emilio Ocampo, autor de um livro (em coautoria com Nicolas Cachanoski) cujo título fornece uma indicação muito forte sobre o que poderá se passar: Dolarización: Una Solución para la Argentina.

Risco sempre presente

Entretanto, é difícil imaginar que a Argentina consiga implementar um regime como o do Equador, de dolarização sem “currency board”, e sem uma moeda fiduciária nacional. Esta seria a próxima variante (a última?) ainda não tentada, ainda mais radical que o “Plano de Conversibilidade”, associado ao ministro Domingo Cavallo, de 1991, e que colapsou em 2002.

Parece também difícil imaginar que isso possa ser tentado sem que ocorra algo como um “Plano Bonex” (o equivalente argentino para o confisco do nosso Plano Collor). Vamos aguardar.

Enquanto isso no Brasil, em imenso contraste, vamos festejando discretamente os 29 anos do padrão monetário iniciado em 1994, e refletindo sobre o longo prazo, ou sobre os próximos 30 anos de política monetária e de mercado de capitais, em um ambiente de estabilidade de preços, ou de inflação de Primeiro Mundo.

As primeiras três décadas do real foram muito profundamente marcadas pelas dores do tratamento.

Demorou pouco menos de três anos, a partir do Plano Real, para que a inflação, medida pelo IPCA, caísse abaixo de 5% anuais no acumulado de 12 meses. Mas foram mais de 25 anos para a SELIC chegar nesse patamar. O COPOM, que foi criado em 1996, se reuniu 226 vezes antes de colocar a SELIC em 4,5% anuais em 11/12/2019.

Foi uma trajetória longa e tormentosa e uma de suas lições mais cruéis é que não há cura definitiva: o risco de retorno da velha senhora está sempre presente e requer esforço permanente de prevenção.

A experiência recente da Argentina serve como valioso referencial para os que não lembram, ou que não viveram as dificuldades dos anos 1980, e não compreendem a gravidade e a complexidade de uma hiperinflação.

Passados 30 anos do Plano Real, e mesmo depois de longa desintoxicação, a inflação permanece uma ameaça, ainda que numa ordem de grandeza diferente da que teve no passado. Feita a ressalva, é interessante refletir sobre o horizonte que se apresenta para a política monetária e para o mercado de capitais brasileiro.

Ressalvada uma deterioração fiscal significativa, que sempre parece estar na próxima esquina, mas que, em verdade, é bem mais difícil de ocorrer hoje do que já foi no passado, é legítimo admitir que o Tesouro deverá encontrar melhores condições de (re)financiamento de sua dívida nos próximos 30 anos, especialmente se comparadas às condições observadas nos primeiros 30 anos do real.

Em tempos de crise fiscal, parece claro que a manutenção de juros reais positivos, todos dias a cada dia, funcionava como uma garantia de backstop público contra os efeitos da inflação, e como uma condição essencial para afastar o risco de uma hiperinflação. Eram os tempos do overnight.

É claro que a situação fiscal brasileira não é a de um país que tenha sequer o “grau de investimento”, mas a crise fiscal aberta do início da década de 1990 parece ter ficado para trás. Entretanto, o reconhecimento desses progressos “institucionais” ficou mais difícil depois que o próprio presidente da República politizou as taxas de juros, com isso incentivando os economistas, e mesmo o Parlamento, a cerrar fileiras em apoio ao Banco Central e a voltar suas atenções para a sustentabilidade fiscal.

Com efeito, o assunto do equilíbrio fiscal está bem longe de estar resolvido, e a aprovação do chamado     “arcabouço fiscal”, em linha com o determinado pela PEC da Transição, representa nada mais que um passo relativamente tímido nessa direção. O país recebeu um upgrade na classificação de risco soberano, mas ainda permanece firmemente abaixo do “grau de investimento”.

Do ângulo intertemporal, a ideia de efetuar um “ajuste fiscal permanente”, ou de adotar um regime fiscal que de fato estabeleça a sustentabilidade fiscal, destinado a colocar o país na região do “grau de investimento” deveria ser um no-brainer. Reduções de despesa hoje se transformariam em grandes economias de juros no futuro.

É simples: ficaria mais barato para o Tesouro (re)financiar sua dívida porque haveria menos risco. Se o país chegar ao “grau de investimento”, e mesmo ultrapassar essa marca em dois ou três degraus (chegando no nível do Chile, por exemplo), certamente conseguiria reduzir substancialmente o custo de sua dívida, com imensa vantagem fiscal.

Mas as decisões de política fiscal não são feitas com essa lógica.

O ministro da Fazenda deveria ser o depositário desses princípios, o que, todavia, não parece ser o caso. A atenção do ministro parece unicamente concentrada nos impostos, e muito pouco em redução de despesa. O arcabouço foi uma boa iniciativa, mas é menos efetivo e restritivo que o teto de gastos. Suas metas de superávit primário não parecem factíveis, nem mesmo na banda inferior, o que remeteu o ministro da direção dos impostos e do desgaste.

A associação do ministro, e do governo, ao aumento da carga tributária, aliada à leniência com a despesa, deverá ficar mais flagrante e politicamente custosa.

A ministra do Planejamento, Simone Tebet, perdeu espaço e não faz contraponto ao ministro, até pelo contrário, parece se alinhar ao petismo mais radical, que, talvez por profissão de fé ou obrigação política, não apoia o ministro da Fazenda.

O ministro Haddad tentou encontrar linhas de menor resistência no campo da arrecadação, com o propósito de não descumprir muito flagrantemente sua promessa de não aumentar a carga tributária, mas não está fácil. Os sites de varejo para pequenas compras – que funcionam com “sacoleiros” em e-commerce – e os de apostas esportivas são novas fontes, mas de potencial limitado para as ambições do governo.

Os esforços para a tributação dos recursos offshore, bem como dos fundos exclusivos, exigiram um “esforço de vendagem” através do argumento de que eram tributações sobre “super-ricos” que, por qualquer razão, tinham sido “esquecidas” pelos seus antecessores. Em ambos os casos, todavia, há um problema formal em se tributar estoques, portanto o já acontecido, evocando a velha máxima pela qual também o passado, no Brasil, é incerto.

Panorama de investimentos

Num cenário em que o governo encontra um bom caminho para a política fiscal e se aproxima efetivamente do “grau de investimento”, faz sentido especular sobre o que se passará com os juros e com o panorama de investimentos.

Num cenário de sustentabilidade fiscal, não faria mesmo muito sentido que o Tesouro refinanciasse sua dívida pagando juros maiores que a inflação a cada dia todos os dias. Teria que haver uma conversa sobre o “desligamento”, talvez impossível no Brasil, do custo do financiamento da dívida pública e a política monetária.

Na planície, enquanto isso, os investidores brasileiros se acostumaram a ganhar da inflação, e do CDI idealmente, todos os dias e a cada dia, mesmo que mantenham suas aplicações por prazos longos e não precisem da liquidez.

Consolidamos uma “cultura do CDI diário” da qual não se consegue escapar, e que é preciso superar para que o mercado de capitais brasileiro progrida e para que o financiamento do governo seja mais barato.

É claro que será mais barato se for menos arriscado, como acima observado. O que nos leva de volta ao problema fiscal, infelizmente ainda não resolvido, e nem mesmo reconhecido em toda a sua complexidade.*

É muito possível, talvez bem provável que em meados do ano que vem, a prevalecer o ritmo de redução da SELIC indicado na última reunião, ocorrida em 2 de agosto, o Banco Central venha a enfrentar um debate sobre onde pode estar a “taxa neutra”. Ou sobre até que nível de SELIC irão as reduções.

O Relatório FOCUS registra a expectativa de 11,75% para SELIC na virada do ano de 2023, implicitamente projetando três cortes de 0,5% para as três reuniões marcadas para este ano.

Para 2024, todavia, o FOCUS projeta 9,00% para o fim do ano, mas se o COPOM permanecesse cortando 0,5% a cada reunião, o ano de 2024 terminaria com 7,75%. Implicitamente se projeta, portanto, que o COPOM enxergará que chegou na taxa neutra em meados de 2024.

Mas o debate será interessante sobre o nível em que verá aterrissar a SELIC nesse ciclo de baixa já iniciado. A trégua que o presidente da República deu ao BC pode ser removida e as hostilidades podem se renovar, bem quando o mandatário terá que fazer a sua escolha para os três dirigentes do BC cujos mandatos se encerram em dezembro de 2024, aí incluído o do presidente Roberto Campos Neto.*

A atmosfera política está amena, como é próprio da meia estação, mas talvez apenas na aparência. Parece não esmorecer o noticiário referente ao ex-presidente Jair Bolsonaro, mas a fila anda, e o Legislativo vai lidando com novas pautas de interesse do governo.

As relações entre o Executivo e o Legislativo têm sido conduzidas com enorme cuidado. O rescaldo das eleições é complexo. É claro que haveria mais velocidade nos projetos de governo caso aprovada a reforma ministerial que se destina a proporcionar mais espaço político para o chamado “Centrão”. Mais velocidade, nesse contexto, naturalmente significa menos identificação com a agenda caracteristicamente petista, pois muda relevantemente a identidade do próprio governo. Compreende-se, portanto, a indefinição do presidente Lula.

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Em defesa da agenda verde

No momento em que eventos climáticos extremos se tornam cada vez mais frequentes, o Brasil tem a chance de implementar a agenda verde, que são políticas que podem mitigar impacto das mudanças climáticas

por Helena Margarido

Ondas de calor extremas, incêndios, mortes e graves problemas de saúde pública acometem países da Europa, América do Norte e norte da África. Chuvas intensas e fortes inundações atingem o sudeste asiático. Grandes secas, e intensos incêndios florestais, consomem áreas do oeste dos Estados Unidos e Canadá. Recordes de temperaturas são batidos todos os dias, e o mês de julho registrou a semana mais quente dos últimos 150 anos.

Chuvas extremas no nordeste brasileiro, ciclones no sul do país. Aos eventos climáticos extremos cada vez mais frequentes, consequências do aquecimento global, soma-se agora o fenômeno El Niño – que pode durar anos – e a temporada de incêndios (criminosos ou não) na Amazônia e outros biomas brasileiros.

Não se tem precisão científica sobre quanto tempo este fenômeno durará e a intensidade dos impactos, mas as evidências das mudanças climáticas e a urgência no enfrentamento à crise climática têm sido uma constante nos relatórios científicos do IPCC (Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas) há muitos anos.

Ação e conscientização dos governos pelo mundo

Ao longo de um processo negociador que já dura mais de 30 anos, os governos do mundo todo vêm se comprometendo a tomar medidas que impeçam uma catástrofe global. Redução de emissão de gases de efeito estufa, transição energética, fim do desmatamento ilegal de florestas, neutralidade de carbono até 2050, financiamento para políticas de adaptação às mudanças climáticas, justiça climática.

São vários ciclos de negociações, todos os anos, reunindo representantes dos 196 países que assinaram a Convenção do Clima – e, dentre estes, dos 195 que se comprometeram perante o Acordo de Paris, acordo global mais recente para o combate às mudanças climáticas, assinado em 2015, a adotar medidas cada vez mais ambiciosas no enfrentamento à crise que acomete a todos, mas de formas muito diferentes e desiguais.

Enquanto as negociações internacionais são essenciais para estabelecer os parâmetros e constranger os países a se envolverem nas soluções, é no âmbito local que as ações são implementadas. No Brasil, os quatro anos do governo de Jair Bolsonaro foram pautados pelo obscurantismo: apagão de dados, cortes no orçamento para pastas que lidam diretamente com as questões ambientais e indígenas (dentre outras), cortes no financiamento de pesquisas, negacionismo como base ideológica, desmonte de órgãos de fiscalização (como o IBAMA), incentivos a uma cultura exploratória e colonizadora da Amazônia.

Tudo isso está bem documentado em reportagens, artigos acadêmicos, livros e relatórios produzidos pela equipe responsável pela transição e que forma o governo atual. Há, portanto, muito a reconstruir. Tivemos retrocessos enormes, e agora resta pouco tempo para avançar em temas cruciais, como a construção de uma agenda verde, de um plano de transição para uma economia de baixo carbono, de estratégias reais de desenvolvimento sustentável e de combate ao desmatamento e ao crime organizado que se estabeleceu na Amazônia.

Agenda verde: ponto de não retorno

É inegável que a Amazônia desempenha papel crucial no combate à crise climática, e cientistas têm alertado nos últimos anos que a maior floresta tropical do planeta está bem próxima do chamado ponto de não retorno, ou seja, quando a sua capacidade de absorver carbono entra em xeque. O estudo Nova Economia da Amazônia, publicado recentemente pelo World Resources Institute (WRI) sob coordenação do cientista Carlos Nobre, traz uma alternativa à economia do desmatamento que domina a Amazônia.

Essa alternativa passa por restringir as emissões de gases de efeito estufa, apoiada em transição tecnológica, e por zerar o desmatamento, descarbonizando a agropecuária e a matriz energética. Segundo o estudo, reorientar a economia da Amazônia Legal, com aumento de PIB, geração de emprego e aumento da cobertura florestal, exige um investimento de 1,8% do PIB nacional ao ano, até 2050. Há, portanto, propostas viáveis e executáveis. Mas há vontade política e pressão da sociedade brasileira para que uma agenda verde e social seja de fato implementada?

Iniciativa do governo em defesa do meio ambiente

O governo tem dado demonstrações de interesse em fazer essa agenda avançar, apesar de não haver consenso dentro do próprio governo e de sua base de apoio (como, por exemplo, o velho pensamento desenvolvimentista).

As iniciativas de mudanças vão do nome do Ministério do Meio Ambiente, incorporando as Mudanças do Clima, à criação do Ministério dos Povos Indígenas e nomeação da advogada indígena Joenia Wapichana para presidir a FUNAI à divulgação do novo PPCDAm (Plano de Ação para a Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal), passando pelo anúncio de Belém como sede da COP 30, em 2025.

Em seus discursos, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem dado ênfase às políticas de proteção ambiental e de combate às mudanças climáticas. Sob liderança da ministra Marina Silva, mas sob uma perspectiva interministerial e transversal.

Plano estratégico do Ministério do Meio Ambiente

De acordo com as ações e falas do governo, as estratégias para reverter todos os todos os malefícios podem ser agrupadas em quatro eixos:

  • Comando e controle;
  • ordenamento fundiário e territorial;
  • atividades produtivas sustentáveis;
  • instrumentos normativos e econômicos.

Sabemos, no entanto, que interesses poderosos, de grandes corporações ligadas à mineração e do agro, estão bastante representados no Congresso Nacional e que há grandes dificuldades políticas para aprovação de um plano de transição para uma economia de baixo carbono, além dos muitos ataques aos direitos das populações indígenas e à preservação ambiental.

O Brasil tem um grande potencial para a implementação de políticas de redução de emissões, de diversificação de fontes de energia e do desenvolvimento de uma bioeconomia da sociodiversidade, mas sob uma perspectiva essencialmente brasileira e que de fato incorpore o pensamento indígena no planejamento do futuro da Amazônia e do Brasil.

Para que esse potencial se concretize, a demarcação e a proteção dos territórios indígenas são fundamentais. Os desafios, portanto, são imensos. Mas os instrumentos legais e estratégias viáveis já existem, é preciso decisão política. A realização da COP 30 na Amazônia brasileira traz importante potencial de mobilização, mas essas decisões dificilmente acontecerão sem que a sociedade brasileira pressione por uma agenda verde e social.

Só que o tempo para essas escolhas é apertado.

Helena Margarido Moreira, doutora em Geografia (USP), professora de Relações Internacionais e pesquisadora na área de clima e energia.


[1] Disponível em: https://www.wribrasil.org.br/sites/default/files/2023-06/Sum%C3%A1rio%20Executivo%20%28portugu%C3%AAs%29.pdf. Acesso: 26/07/2023.

[2] Por falar em Carlos Nobre, vale a pena conferir a entrevista que o climatologista concedeu ao Podcast Rio Bravo em maio de 2022. “A ciência mundial está muito preocupada com o destino da Amazônia”. Disponível em: https://soundcloud.com/riobravoinvestimentos/podcast-698-carlos-nobre-a-ciencia-mundial-esta-muito-preocupada-com-o-destino-da-amazonia

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Crise das varejistas: fator localização para os fundos imobiliários

Crise das varejistas e o impacto que isso pode causar aos fundos imobiliários

Em 2023, os cenários doméstico e global permanecem desafiadores: por aqui, as preocupações com a trajetória da dívida pública, passando pela discussão da nova âncora fiscal, além da crise das varejistas que ecoam desde janeiro.

No exterior, as discussões sobre a inflação e a elevação dos juros seguem aquecidas. No curto prazo, as incertezas dessas variáveis tornam o ambiente econômico altamente restritivo, penalizando projetos devido ao elevado nível de juros – ou seja, custo do dinheiro – e enxugando a liquidez do mercado, com menor apetite ao risco.

Em meio a este cenário, o setor de varejo, cíclico e muito conhecido por operações que contam com baixas margens de lucro, além de elevado capital de giro, tem sofrido forte impacto e gravado a crise das varejistas. É justamente nesse contexto que o consumo também diminui, dificultando ainda mais os índices operacionais das companhias.

Por outro lado, empresas bem gerenciadas, com boa estrutura de capital, bons planos de expansão e investimentos conseguem ganhar market share e despontam dentro de seus setores.

É esperado então que neste ambiente ocorra uma crise das varejistas, e as empresas menos preparadas acabem expondo os mais diversos e profundos problemas.

Em janeiro e fevereiro, casos de rombo contábil, pedidos de recuperação judicial, planos de renegociação de dívidas, fechamento de lojas e despejo por falta de pagamento agravaram a crise das varejistas e penalizaram a imagem do setor perante a credores e investidores.

Juros mais baixos pode ser a solução para a crise das varejistas

*O gráfico leva em consideração um pool de empresas varejistas listadas em bolsa e seu respectivo indicador, ponderado por seu valor de mercado em cada período. Empresas consideradas: Lojas Renner, Guararapes, C&A Modas, Lojas Marisa, Grupo Soma, Arezzo Co, Grupo SBF, Magazine Luiza, Via e Americanas.

No gráfico , é possível perceber que, ao longo dos trimestres, o nível de endividamento, medido pelo tamanho das bolhas, chegou a diminuir, exatamente no período em que as taxas de juros estavam baixas e as empresas puderam se capitalizar.

Porém, este nível está voltando ao patamar mais elevado registrado no começo da série, contando agora com um nível de juros mais restritivo e que penaliza a lucratividade das empresas.

Isso pode ser visto através do patamar da capacidade de pagamento de despesas financeiras: em meados de 2018, o EBITDA registrado pelas empresas era capaz de cobrir o pagamento de juros em, aproximadamente, sete vezes. Ou seja, em média, o EBITDA de um ano cobria sete anos de despesas de juros.

Esse indicador atualmente está em duas vezes. Dito de outro modo, apesar do tamanho da dívida em relação ao patrimônio líquido das empresas não estar em um patamar consideravelmente superior ao registrado há cinco anos.

O custo desta dívida pesa mais no operacional das empresas, já pressionado pelo baixo consumo, devido ao elevado patamar de juros.

Quando olhamos para outro indicador, dívida líquida sobre EBITDA, amplamente utilizado pelo mercado, e fazemos o mesmo tratamento de ponderação pelo valor de mercado, vemos que a dívida cobria apenas 1,18 vez o EBITDA em 2017, e em 2022 este indicador deteriorou-se, atingindo 2,09 vezes.

Esses são números que não necessariamente prenunciam nenhuma catástrofe generalizada, servindo apenas para evidenciar a deterioração causada pelo ambiente mais restritivo.

Localização, localização e localização

Neste contexto, se faz mais necessário do que nunca avaliar os Fundos Imobiliários para além da qualidade de seus inquilinos e tipo de contrato de locação. A premissa básica do setor imobiliário – localização, localização e localização – precisa ser ressaltada.

Um imóvel comercial voltado para o varejo, bem localizado, flexível, com boa disposição, com fachada ampla, em região consolidada, com grande fluxo e fácil acesso a transporte público, tende a ter maior resiliência e crescimento de receita ao longo do tempo, por conter características ótimas para exposição e posicionamento de marca.

Por óbvio, a qualidade do inquilino, refletida principalmente na baixa inadimplência esperada, é um grande atributo para o investimento em imóveis. Um contrato de locação forte, que provê garantias ao locador, consolidada pela jurisprudência, também ajuda compor o valor do imóvel.

No entanto, em momentos em que as operações dos inquilinos e até a saúde financeira das empresas que operam utilizando aquele “tijolo” entram em xeque, as características imobiliárias se tornam mais importantes para composição do valor do imóvel, e conseguem evidenciar que um bom investimento imobiliário se faz olhando principalmente para a localização – e de forma secundária, para a qualidade do inquilino e o contrato de locação.

Isso porque, no varejo, uma operação é facilmente substituída quando se trata de uma localização privilegiada, incluindo ganhos com lease spread positivo e, não muito raramente, valores de venda de ponto.

Imóveis em boas localizações tendem a ter demanda sempre, ainda que em patamares de aluguéis mais baixos, enquanto imóveis em localizações ruins podem ficar sem qualquer tipo de demanda por bastante tempo, prejudicando muito o fluxo de caixa do investidor.

Esse direcionamento pode não ser facilmente percebido olhando apenas o curto prazo, mas fica muito evidente no longo prazo graças à resiliência de receita na perpetuidade.

Rio Bravo Renda Varejo (RBVA11)

No fundo imobiliário da Rio Bravo voltado para o varejo de rua, temos diversos exemplos dessas transformações do imóvel em pontos importantes e considerados premium para o varejo. Na região dos Jardins, em São Paulo.

O Fundo possui um imóvel que tinha uma operação de restaurante e, com o encerramento da operação, o espaço então entrou no radar de marcas importantes, e atualmente está locado para uma operação do Coco Bambu, que também utilizou o ponto para a consolidação de sua mais recentes marca, o Vasto.

Também em São Paulo, a Avenida Paulista com a Pamplona (foto abaixo), um ponto de esquina, muito valorizado pelo varejo, foi o local escolhido para comportar a loja flagship da Centauro, no lugar que antes era ocupado por uma operação de drogaria.

Suas características são extremamente valorizadas pelo mercado: localização privilegiada em um dos mais importantes cartões-postais do país, próximo a grandes prédios corporativos, em frente ao metrô, testada extensa e com excelente visibilidade de marca.

Sua localização privilegiada promove um fluxo intenso de pessoas, tanto durante a semana quanto nos fins de semana. No Leblon, no Rio de Janeiro, o Fundo detém uma loja que era locada para uma varejista de moda e deu lugar para uma nova locação para o Itaú, que promoverá, no local.

A partir do segundo semestre do ano, a primeira operação física do banco voltada para investimentos no Rio de Janeiro. O ponto se localiza em uma das regiões mais
nobres do Rio, em frente ao Shopping Leblon, consolidado e que centraliza um alto fluxo de pessoas.

Os exemplos citados acima evidenciam a demanda que imóveis bem localizados capturam, cujo valor do tijolo em si tem um certo grau de independência em relação ao inquilino e ao tipo de contrato de locação.

A resiliência do ativo, que é um produto de todos os fatores já citados sobre qualidade e localização, vai ditar a demanda pelo ativo no longo prazo, que deverá ser capaz de atrais bons inquilinos, passando por diversos ciclos.

Em momentos mais restritivos economicamente, é preciso se atentar aos fundamentos do ativo objeto, precificando corretamente o risco de crédito dos contratos, buscando a rentabilização do portfólio de maneira equilibrada.

Anita Scal, Sócia e Diretora de Investimentos Imobiliários, e Abner Melo, Analista de Portfólio.

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Fundos de CRI: o que são e por que investir?

Fundos de CRI e a importância de um investimento seguro

Dia a dia, os fundos imobiliários de recebíveis ou fundos de CRI vem ganhando destaque no mercado. Olhando o histórico da composição do IFIX, principal índice do mercado de FIIs, essa evolução é notória. Se, no começo de 2013, eles ocupavam menos 2% da carteira, hoje, os “fundos de papel” já são a maior fatia, com mais de 45%.

Entretanto, uma dúvida pode persistir: o que são os fundos de recebíveis? Se você fizer uma consulta rápida em qualquer site de buscas, vai encontrar que são fundos que não investem em imóveis, mas sim em Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs), o que pode não ser a definição mais compreensível para alguém que não é do mercado financeiro.

Afinal, se eles não investem em imóveis, de onde vêm as receitas que esses fundos distribuem aos seus cotistas?

Neste artigo, vamos começar explicando o que são os fundos de CRI. Depois, vamos ver sobre os fundos de recebíveis: como eles investem em CRIs, geram retorno aos seus cotistas, seus benefícios e seus riscos. Por último, vamos explorar as diferenças entre os fundos High-Grade e os High-Yield.

Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs)

Os (CRIs) são títulos de dívidas emitidos por empresas do mercado imobiliário como uma forma de levantar capital para a realização de construções ou aquisições de imóveis. O valor é emprestado por investidores que passam a receber juros sobre os valores investidos.

Vamos ilustrar com um exemplo: uma construtora quer levantar um empreendimento residencial, com vários blocos e centenas de apartamentos. Ao invés de usar o próprio caixa ou tomar um empréstimo com um banco, ela pode emitir um CRI, que é vendido para investidores.

O valor arrecadado é usado para financiar a construção e, conforme as vendas dos imóveis são realizadas, o dinheiro recebido pela construtora é utilizado para pagar o valor emprestado, com juros já previamente definidos.

Ou podemos pensar em uma empresa que administra shopping center e vai comprar mais um para o seu portfólio. Então, a companhia emite um CRI e o valor aportado pelos investidores vai para aquisição do imóvel. Ao longo dos meses seguintes, parte dos aluguéis pagos pelas lojas é destinado aos investidores até que o capital seja devolvido juntamente com os juros.

Para a empresa, é uma operação interessante, pois as taxas de juros costumam ser mais baratas do que um empréstimo do sistema bancário e o CRI pode ser emitido com regras mais personalizadas, como prazos mais longos de pagamentos e flexibilidades de taxas e carências que uma instituição financeira convencional não costuma aceitar.

Já para os investidores, é uma possibilidade de ter uma rentabilidade maior que os investimentos de renda fixa mais tradicionais.

Além disso, geralmente, os fundos de CRI conta com garantias muito fortes. As mais comuns são a alienação fiduciária dos imóveis envolvidos, a fiança dos donos da empresa que está tomando o recurso e o seguro de instituições financeiras.

Ademais, é muito frequente a cessão dos recebíveis. Ou seja, voltando aos nossos exemplos, os boletos bancários das parcelas dos apartamentos ou dos aluguéis das lojas não pagos para a empresa que emitiu o CRI, mas para uma empresa terceirizada – chamada servicer – que faz o acompanhamento desses recebimentos e já os repassa para pagamento do CRI.

Isso evita que os valores pagos possam ser desviados pela empresa devedora ou que possam ser alvo de penhoras judiciais e outros problemas que podem acontecer.

Os FIIs de CRI – os “Fundos de Papel”

Agora que já entendemos o que são os CRIs, já temos uma base mais sólida para compreender como funcionam os Fundos Imobiliários de Recebíveis, apelidados de “FIIs de papel”. E é fácil de entender o motivo do nome: enquanto os “FIIs de tijolo” investem na compra de imóveis, como prédios comerciais, os fundos “de papel” vão investir em CRIs e outros títulos do mercado financeiro.

Quando você aplica em um FII de Recebíveis, você se torna cotista junto com as centenas ou milhares de pessoas que também têm cotas daquele fundo. Com esse recurso, a equipe de gestão vai fazer a alocação nos CRIs com a melhor relação risco-retorno dentro das normas estabelecidas pelo regulamento do fundo.

Como vimos acima, as parcelas pagas pelos CRIs incluem o capital – que é a devolução do valor inicialmente investido pelo fundo naquele título – e os juros. Conforme recebe os juros dos CRIs da sua carteira, o fundo repassa para os seus cotistas, geralmente de forma mensal, como rendimentos. O valor do capital permanece no caixa do fundo para que ele possa fazer novas alocações em outros títulos.

Principais vantagens dos fundos de CRI

  • Acesso a um mercado exclusivo: a maioria dos CRIs não são oferecidos aos pequenos investidores pessoa física. O público principal são grandes investidores, estrangeiros e fundos de investimentos. Soma-se a isso o fato de que, frequentemente, o valor mínimo de aplicação em um CRI é de R$ 300 mil (ou até mais). Já os Fundos Imobiliários estão disponíveis para qualquer investidor, com valores de aplicação de R$ 100,00 ou menos. Então, os FIIs de Recebíveis te dão acesso a um mercado que você não alcançaria de maneira individual.
  • Diversificação: Cada FII de papel investe em dezenas de CRIs diferentes. Isso, somado ao baixo valor de cota, permite ao investidor pessoa física repartir seu capital em vários fundos, cada qual com vários CRIs. Dessa forma, caso algum CRI tenha algum problema, como uma inadimplência ou uma renegociação de condições, o impacto ao investidor quase insignificante.

Riscos dos fundos de CRI

  • Riscos de mercado: os fundos imobiliários são negociados em bolsa de valores. Assim, estão sujeitos a períodos de altas e de baixas, tanto por questões particulares como por conjunturas econômicas.
  • Risco de índices econômicos: a maioria dos CRIs é emitida com uma taxa de juros ligada ao IPCA ou ao CDI. Então, a piora de um desses indicadores pode ter um efeito importante na receita dos fundos e, consequentemente, na sua distribuição de rendimentos.
  • Riscos de concentração de carteira: alguns fundos podem ter parte significativa dos seus CRIs ligada a um mesmo devedor ou a um único segmento, como o setor de hotelaria. Um problema em um mercado específico pode gerar um impacto mais forte nos fundos com maior exposição ele.

Fundos High Grade e High Yield

Conforme o mercado de FIIs de Recebíveis vem crescendo, também aumenta a necessidade de criar classificações que facilitem ao investidor analisar e interpretar dos fundos e diferenciar um do outro. Atualmente, a classificação considerada mais importante é por nível de risco, e, disso, surgem duas nomenclaturas: os fundos High Grade e os High Yield.

Os Fundos High Grade são aqueles que aplicam em títulos lastreados em recebíveis imobiliários de alta qualidade, geralmente emitidos por empresas estabelecidas e com boa situação financeira.

Esses fundos são considerados mais seguros do que os Fundos High Yield, uma vez que os emissores dos ativos são mais estáveis e têm menor probabilidade de inadimplência. No entanto, a rentabilidade dos Fundos High Grade costuma ser mais baixa do que a dos Fundos High Yield.

Já os fundos High Yield são focados em títulos com um risco de crédito mais alto, mas que busquem compensar isso com uma taxa de rentabilidade mais interessante. Os segmentos mais comuns de atuação desse segmento são os CRIs de hotelaria, de incorporação e de loteamentos.

Grosso modo, as empresas devedoras são menores e atuam em mercados onde o financiamento bancário é mais escasso e mais caro, o que as tornam mais propensas a pagar os juros mais altos em um CRI que uma empresa mais estabelecida.

Fundos de CRI da Rio Bravo

A Rio Bravo faz a gestão de fundos de CRI de ambos os perfis, tanto high grade quanto high yield. São eles: Rio Bravo Crédito Imobiliário High Grade (RBHG11) e o Rio Bravo Crédito Imobiliário High Yield (RBHY11), respectivamente.

Como investir?

Os fundos Rio Bravo Crédito Imobiliário High Grade e o Rio Bravo Crédito Imobiliário High Yield são listados na B3, a bolsa de valores de São Paulo. Assim, é possível comprar e vender cotas deles diretamente na sua corretora, via site ou aplicativo de celular. Basta procurar pelo código de negociação RBHG11 ou RBHY11.

Vale ressaltar que os riscos aqui relacionados são apenas alguns que devem ser observados por qualquer investidor interessado em adquirir cotas dos fundos. É obrigatória a leitura do Prospecto dos fundos, em especial a seção “Fatores de Risco”, antes de qualquer decisão de investimento, disponível nas páginas dos fundos.

As particularidades dos fundos imobiliários

Quando pensamos em fundos imobiliários, a primeira ideia que nos vem à mente são os fundos que compram diretamente imóveis. Mas nossa imaginação não precisa parar por aí, pois existem muitas outras estratégias para operar no mercado imobiliário, como os Fundos Imobiliários de Recebíveis.

Estes, ao invés de adquirir galpões, shoppings e prédios comerciais, investem em CRI, ou seja, emprestam recursos para que empresas do mercado imobiliários. Em contrapartida, recebem juros desses empréstimos, que são repassados aos seus cotistas como rendimentos.

Para investir em fundos deste tipo, é preciso que o investidor observe se estão de acordo com seu perfil de investimento, leiam os documentos obrigatórios e entenda a estratégia de investimento de cada um.

Fundos de CRI podem ser boas formas de diversificar os riscos e a exposição da carteira do investidor, já que têm uma estrutura de FIIs, com pagamentos periódicos de proventos, somado a uma ampla gama de possibilidades e riscos de operações.

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Brasil 2023: Para entender o impacto das mudanças climáticas

O tema mudanças climáticas já não é mais uma preocupação exclusiva dos ambientalistas. No Brasil e no exterior, os chamados eventos extremos, como enchentes e alagamentos, parecem ser o novo normal, causando pânico na população mais fragilizada e temor junto aos governos e empresários.

Na quarta edição da série Brasil, 2023, o Videocast Rio Bravo apresenta uma discussão elevada a respeito desse tema. Para tanto, conta com a expertise de das convidadas desta atração, a saber: Suzana Kahn Ribeiro, vice-diretora da Coppe/UFRJ, e Tatiana Assali, diretora de programas da Natural Intelligence.

No videocast, enquanto Suzana Kahn atenta para o fato de que a preocupação com as mudanças do clima tem a ver com o presente (“O problema não é dos nossos netos; é da nossa geração”) e fala a respeito das oportunidades perdidas pelo governo brasileiro em relação a essa agenda, Tatiana Assali comenta de que maneira as empresas e o mercado financeiro podem participar de forma mais efetiva no que se refere às ações necessárias para evitar o colapso climático. “Nós não podemos segmentar os impactos do que está acontecendo. Não é só a empresa. Não é só o mercado financeiro. O impacto é generalizado”.